domingo, 11 de agosto de 2013

Com a de-vida distância XI

Cadeira e mesa vazias - Barcelona, Vitor Vicente, Agosto de 2011

Nas antevésperas de completar sete anos fora de Portugal, pergunto-me ainda por alguns porquês. Pergunto-me pelo porquê daqueles que partiram e pelo porquê daqueles que não partiram nunca.
Pergunto-me sem que a realidade me dê qualquer resposta. Ainda assim, autista, mouco aos ouvidos mudos do mundo, prossigo. 
(Para quem acha obra inútil e quem não continuar este absurdo caminho, fica o aviso para ficar por este capítulo).
Primeiro, pergunto-me por mim. Onde teria estado eu durante estes anos, se nunca tivesse partido? Quando pergunto onde, pergunto pelo paradeiro pensamento. Pois é do irrequieto poiso dos pensamentos que este questionar se ocupa. Que pensaria eu do estrangeiro? Tomaria-o como um espaço tão inacessível quanto as estrelas? Ou, simplesmente, não lhe faria caso, sem estar consciente de que viveria de costas voltadas para o mundo? 
Mas, por caso - e esta é, para quem não deu conta, a segunda pergunta - todos aqueles que partiram terão abraçado mais mundo que a pátria que os pariu? Já aqui (acho) referi os que partiram sem nunca terem partido, os profundamente provincianos que se disfarçam de toda-a-terra. Gente para quem a diáspora é um desperdício e que continua a viver o seu dia-à-dia como se nunca tivesse conhecido outra casa que não a sua, ou outra que à sua se pareça.
Depois, há ainda os que partem como quem procura. Que farejam a fastidiosa imbricação dos factos como se fosse feita de material feérico, como se pudesse ser cenário de uma fábula sem tempo, nem espaço. Estes partem como existem: sem explicações. Estes, sim, que são a falsa partida em pessoa. Nunca partiram porque nunca estiveram em lado algum. Se permanecem, é por pura preguiça e um certo sentido de inércia a que não é alheia a inocência e uma certa tendência para se irmanar ao infinito. Se querem coser-se a uma cidade, dali ninguém os tira ou dá ordem de saída. Na verdade, bem podem viver num cem-número de cidades que sempre serão um sem-número de sítios. Desta estirpe, entre a espécie, nunca me foi apresentado um exemplo. Só existem nos livros e nos ecrans das salas de cinema, em suma nos nobres salões dos sonhos que não são parte do património de nenhum século, nem da - desculpem se desiludo alguém - Paris do Século XIX. 
(E um pequeno parêntesis para os que, independentemente de terem partido pouco, muito ou mais ou menos, jamais terem partido de si próprios. Os que, num par de palavras, nunca se confrontaram com a sua consciência. Já era hora de a pôrem em causa, de lhe tirarem as calças e de a chamar de desavergonhada. Derrubado do altar, poder-se-á então ver os alicerces em que se fixa o ambulante circo das humanas convicções. O quão frágil é tudo o que se fixa: basta meio dia de dinamite e estilhaçam-se as convicções de toda uma vida, sendo que este processo é mais demorado quanto mais cretina tem sido a dita vida.)
Assim continuo a acompanhar este cais de pseudo-partidas e inconcretizadas chegadas. Jamais entendi o vai e vem dos vivos, quanto mais o dos mortos. A ambos assisto - hoje em dia, mais para o aterrado do que em posição de expetativa -com a de-vida distância. 

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