Irlanda - A bordo da linha férrea Dublin-Sligo, Vitor Vicente, Agosto de 2010
Durante algum tempo, tive o hábito de atribuir uma côr a cada cidade que visitava. Associei o azul a Estocolmo, o laranja a Madrid, o verde a Dublin. Depois, cansei-me. Cansei-me de ter pouca paleta para tantos países, de não ter côres que chegassem para o tamanho do mundo.
Em Dublin, vista agora da perspectiva de residente, continua a reinar, soberano e absoluto, o verde. Por mais que, em Portugal, algumas pessoas tendem a lamentar-me que Dublin é uma cidade cinzenta. Alguns nem conhecem Dublin. Conhecem, se tanto e de um fim de semana, Londres. E por terem visto Londres, ao vivo ou num filme, acham que já conhecem todo o Reino Unido e que a Irlanda é ainda parte do Reino Unido.
Outro preconceito popular, este não só entre portugueses mas entre os latinos em geral, é que a côr do frio é o cinzento. Como se a neve fosse branca escura. Aqui em Dublin quase nem neva. Esta cidade nem se demarca das demais por ser fria. Isso é lá para os lados do Leste, caros latinos, não aqui no Norte. E mais, amigos latinos, os povos louros do Leste não são todos iguais aos povos louros do Norte da Europa. Ou também consideram certo que, abaixo da França, sejamos todos tidos por espanhóis ou italianos e que no Médio Oriente só há árabes e Mesquitas?
Dublin, caros latinos, é chuvosa. Quando chove, em temporada de Inverno, as temperaturas tendem a subir. Não é que se tratem de chuvas tropicais. Aqui podem cair todo o tipo de chuvas, a qualquer altura do ano. Até em pleno Verão, quando a cidade é iluminada durante quase todo o dia, quando o céu oferece um lento lusco-fusco, um crepúsculo capaz de parar o trânsito no dia em que todos os que estiverem ao volante forem poetas, ou, pelo menos, sensíveis à beleza do Poente.
Para isso a Poesia teria que abrir telejornais. A maior precipitação, mundial por sinal, é continuar a crer-se que a côr do frio é o cinzento. Como se não houvesse frio de céu claro e aberto, frio azul. Ou o frio verde e celta da Irlanda. Ou o frio azul-esverdeado que se sente à beira de todos os mares do mundo.
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