domingo, 18 de novembro de 2012

Que horas são em Haaretz? IX

World Peace Center Office - Bairro Judeu de Jerusalém, Vitor Vicente, Junho de 2012

Todos nós, sem que a maioria de nós o saiba, nascemos e crescemos em cidades onde, outrora, se travaram guerras. No entanto, hoje em dia, com a tranquilidade asséptica da tecnologia, cremos viver em cidades-cerco, devidamente muralhadas, longe, para lá do alcance do mundo dos maus - e, assim sendo, nada nos poderá acontecer.
Durante os nossos períodos de lazer - vulgo, quando fazemos férias nos países onde os outros existem para que nós por lá possamos passear - vamos a cidades que também foram cenários de sangue e, se disso estamos a par, depressa o transformamos numa simpática tour patrocinada pela paz do Senhor. É o caso óbvio e mórbido de Berlim e de Belfast, a cidade aonde nada nem ninguém faz turismo, a menos que já viva na Irlanda ou, na mais longíqua da hipóteses, no Reino Unido - e que, quando chega à capital da Irlanda do Norte, dadas as poucas diferenças por estas bandas, nem pode tomar pelo tempo perdido o valente e fulgurante nome de viagem.
Eu também não sou, de todo, inocente. Vivo numa cidade que, recentemente, esteva em pé de guerra e, durante a minha segunda ida a Israel, devidamente contagiado pela calma dos locais, espraiei-me nas esplanadas, na praia e até mergulhei maneiras (digo maneiras por respeito a quem sabe nadar) no Mediterrâneo. Posto isto, não meto as mãos no fogo por mim, muito menos por ninguém. Quem estiver isento, como diz o velho provérbio, que atire a primeira pedra.
Bem visto o território (no caso, o territorio de Haaretz) já não será a primeira pedra. Os Palestinianos atiram  pedras todo o santo dia e até meteram as mãos no fogo. Não só  lançaram chamas ao sul de Israel, como já é costume. Desta feita, o fogo chegou às grandes cidades. Até a Jerusalém, repleta de árabes que, se atingidos, ninguém se chatearia - e quando digo ninguém, digo ninguém da parte dos próprios Palestinianos. 
E digo também Tel Aviv. Custa-me tanto ver Tel Aviv atacada. Vejo em Tel Aviv a tremenda vitória dos Israelitas em conseguirem construir no Médio Oriente uma cidade como qualquer outra. É por isso que, ao atacarem Tel Aviv, estão atacar toda e qualquer cidade civilizada, estão atacar a própria civilização. Estão a atacar a nossa própria cidade. Estão a atacar-nos, ponto.
Custa-me saber que há civis a tremer ao som das sirentes durante o dia, a acordarem ao som das sirenes a altas horas da noite. Custa-me saber da história (história, assim escrito, até parece ficção) de uma velhota que, incapaz de correr para os esconderijos, nos esconderijos deixou o colchão e lá passa vinte e quatro sobre vinte e quatro horas. Custa-me saber que existe crianças que crescem neste contexto de carnificina, que há cabrões que se servem das crianças como escudo e que, em vez de livros e de lápis de côr, enchem-lhes as mochilas com bombas e mandam-nas para o meio das multidões. 
Custa-me tanto tudo isto.
Custa-me ver que estão a chover mísseis em cidades onde também eu fui criança - porque todas as pessoas, ao recuperarem e assumirem um certo sentido de inocência e uma certa candura,  tendem a voltar a ser crianças quando viajam. 
Não admito que as minhas memórias deixem de existir no espaço. Que não possa voltar a um pedaço do mundo que é meu, a que quero voltar e mostrar aos meus . Não admito que me impeçam de voltar a ver os meus amigos que, neste momento, estão debaixo de fogo. 
Foda-se. É inaceitável que tudo isto deixe de existir. Que mais não possam existir que escombros.
Os terroristas são todos escrotos. Todos.
A televisão não mostra que Tel Aviv está a ser alvejada por mísseis. Quando muito, que os Israelitas possuem radares que desviam os ditos. E isso só é mencionado para comparar com o que se passa em Gaza. Onde os cobardes se escondem por trás dos escudos humanos. Onde os canalhas disparam mísseis no meio dos civis para, mais tarde, os civis sucumbirem em vez deles. 
Mas as televisões não mostram isso. Isso, que de tão inaudito me custa a dizer, isso são cidades onde voltei a ser criança e onde, quando menos esperava, voltei a crescer - eu só vejo no meu computador.
Todas os canais de televisão são uns escrotos. Tal como os terroristas. Uns canalhas. Todos. 

4 Comentários:

MJ FALCÃO disse...

Vim aqui ter através de um amigo. Pensei que pouca gente sabe (ou quer saber!) a verdade do que se passa no Médio Oriente.
Israel é um país de que se evita falar.
O anti-semitismo nunca parou nem aqui nem em lado nenhum do mundo. Isto são as verdades...
O resto são desculpas.
Outra verdade é que quem passou por Israel, viveu em Telavive (eu 5 anos) não pode ser "insensível" a esta caça às bruxas que volta diariamente aos "médias" e às conversas.
Gostei de o ler. Senti-me acompanhada!
Kol Tov!
o falcão

Vitor Vicente disse...

É bom sentirmo-nos acompanhados enquanto fazemos vingar a verdade. Muito obrigado pela visita!

MJ FALCÃO disse...

Vou voltar... Para já, boa viagem pelo mundo fora! Na diáspora da vida...
Abraço forte
o falcão

Vitor Vicente disse...

Muito obrigado e um valente e (viajante) abraço!

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