O anoitecer e o amanhecer são a mesma coisa - Reykjavík, Vitor Vicente, Junho de 2011
Tenho trabalhado com tipos de toda a parte do mundo. Desde Nepalenses de metro e meio chamados Dick, passando por Franceses a bocejar vinte e quatro sobre vinte e quatro horas, até Alemães devotos ao dever como Merkel manda. Poucos Irlandeses, por na Irlanda não haver falta de trabalho mas sim por não haver falta de gente que não quer trabalhar, e também por a maioria dos escritórios por onde passei serem guetos de expatriados. Alguns Espanhóis, alguns Catalães e mais Catalães muito Espanhóis do que Espanhóis muito Catalães. A tudo isto e, tanto em Espanha (digo, na Catalunya) como na Irlanda, se têm intrometido bastantes Italianos, tão dados aos serviços mínimos como os Espanhóis (não digo, Catalães) e os Irlandeses e nunca tão serviçais quanto os Portugueses na condição de emigrantes.
Um destes Italianos, certa manhã, acompanhado doutro italiano, entrou no Shuttle Bus que, todas as manhãs do mundo, transporta cargas de ensonados (Franceses, Irlandeses e não só) ao East Point, um dos parques empresariais mais arranjadinhos de Dublin, localizado numa das áreas mais desarranjadas da cidade.
Arranjar, lá tive eu que arranjar a carantonha quando o tal Italiano me foi apresentado como um novo colega, pelo seu compatriota e que não era outro Italiano qualquer, mas um dos Managers da empresa. De imediato, nessa manhã nublada, como nubladas tendem a ser todas as manhãs neste lado do mundo, congratulei-o por ser o seu primeiro dia no escritório. Esforcei-me por parecer animado com a nossa rotina laboral, mais para agradar ao Manager (na altura, eu ainda não tinha contrato efetivo) do que para propriamente com o propósito de animar o recém-chegado.
Passaram-se meses e, já eu pertencia aos quadros da companhia aérea e podia voar ao preço com que a chuva cai em Dublin, quando também o rapaz acabou o chamado período de prova. Logrou atingir os objectivos, recebeu o cartão da empresa e todos os descontos inerentes a ser staff.
Depois, pouco depois, descobriu que estava doente. Emagreceu. O estômago nem o deixava comer. Desapareceu.
Vi-o visitar-nos um par de vezes. Queria voltar à empresa. Queria voltar a voar.
Não voltámos a trocar mais palavras. Ficou-me a manhã em que chegou, pela primeira vez, à empresa. Em que parecia mais um entre tantos, vindos de um dos pigs para o menos pig dos pigs.
Sejamos parte dos pigs ou tomemos alguns países por pigs, ou nem sequer que saibamos que significa essa sigla, somos todos mais um - mesmo. A morte também é mais uma, mas chega para nós todos.
2 Comentários:
Pois sim, Vitor.
Ela sempre chega, nem sempre leve e silenciosa, as vezes sim, muito ruidosa. Nunca é uma "visita" desejada.
Mas... sempre chega.
Ela chega, nós partimos. Coincindências.
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